sábado, 23 de abril de 2016

Dor e Prazer Sexual




Dor e Prazer Sexual
“A construção da excitação erótica é toda ela tão sutil, complexa, inspirada, profunda, fluída, fascinante, aterradora, problemática, imersa no inconsciente e assombrada pelo gênio quanto à criação de sonhos ou arte” – STOLLER, JR. Observando a imaginação erótica – Imago – R.Janeiro, 1998.


No artigo anterior Perversão Sexual e Parafilias sinalizei o conceito de dor e prazer visto sob o prisma da psicanálise, onde a perversão sexual se expressa através de práticas fixas e exclusivas com intuito de proporcionar prazer (orgasmo) sendo considerada um desvio em relação ao ato sexual. Também foi a partir da psicanálise que chegou-se à aceitação de que existe um caráter desarmônico permeando o comportamento das pessoas tanto nas relações sociais como nas práticas sexuais, através de atos de transgressões (pedofilia) ou graus variados de permissividade frente a diversas expressões sexuais a exemplo do sadomasoquismo. Cada cultura e sociedade tem um sistema próprio de valores sexuais que evolui através dos tempos, como a revolução sexual dos anos 60 com maior liberdade principalmente das mulheres após a descoberta da pílula anticoncepcional, o surgimento da Sexologia como ciência e mais recentemente os movimentos libertários da comunidade LGBTS, culminaram com o crescente fenômeno de despatologização de práticas e preferências sexuais antes consideradas perversas. As expressões sexuais que envolvem a erotização da dor em busca do prazer passaram então a serem vistas sob um novo olhar entre os meios científicos mundiais.



Os estados emocionais: tristeza – medo – prazer – raiva, os estados motivacionais primários de sobrevivência: fome – sede – sexo, e os estados sensoriais: temperatura – dor – tato, interligam-se a nível cerebral através de conexões neurohormonais, em áreas especificas do tálamo, hipotálamo, sistema límbico e área pré-frontal. Estas regiões são ricas em monoaminas: noradrenalina, serotonina, dopamina e betaendorfina um opióide endógeno, com receptores específicos para hormônios especialmente hormônios sexuais, o que justificaria a relação entre dor e prazer envolvendo algumas práticas sexuais. Segundo Freud dentro de cada um de nós existem elementos neuróticos, parafílicos e psicopatias sexuais “adormecidas” e que podem eclodir sob diversos aspectos e gradações ao longo da vida.






As perversões sexuais passaram a ser denominadas parafilias, terminologia criada por Steckel, palavra de origem grega que significa: para – ao lado, à margem e philos – amante, atração. As parafilias são transtornos psicossexuais em que a imaginação ou atos são necessários para a excitação sexual e orgasmo, utilizando-se de:
- Objetos não humanos
- Sexo com sofrimento e humilhação
- Sexo sem consentimento do parceiro
- Sexo consensual com permissividade do outro
- Autoerotismo


Os parafílicos expressam sua sexualidade indo de encontro às regras sócio sexuais vigentes criando uma linguagem privada. Seus desejos subvertem a ordem sexual imposta, desconhecendo o outro e não consideram suas práticas como um problema. Só procuram ajuda quando são levados pelos parceiros ou apresentam disfunções sexuais, sofrem repressão da lei através de denúncias e prisões ou através da pratica do autoerotismo fatal por asfixia.


As parafilias apesar de serem comportamentos sexuais atípicos não são mais consideradas transtornos mentais; elas permeiam a sexualidade humana desde que haja consentimento ou não envolva danos físicos, psicológicos e morais a outros. Quando causam sofrimento e violência e são de caráter fixo, rígido, compulsivo e repetitivo, essas expressões passam a ser patológicas são denominadas de transtornos parafílicos. Eles podem trazer consequências danosas para os praticantes, suas vítimas ou parceiros:
- Transmissão de DSTs (HIV, Hepatite, etc)
- Incontinência Fecal (Síndrome de Tardieu)
- Lesões corporais graves
- Alterações anatômicas e funcionais de órgãos
- Hemorragias
- Outros danos

A seguir apresento as principais classificações de transtornos da preferência sexual (TPS) e dos transtornos parafílicos (TP), segundo o CID 10 (Código Internacional das Doenças) e o DSM-5 (Manual Diagnostico e Estatístico de Transtornos Mentais):

Adaptado do livro Sexualidade Humana e seus Transtornos, Carmita Abdo 5 ª ed – 2014.

Para ilustração dos conceitos de parafilias e transtornos parafílicos a exemplos de filmes recentes: Cinquenta tons de cinza, onde a parafilia estar representada com envolvimento emocional do casal inclusive com práticas sexuais diversas; já no filme Ninfomaniaca é um exemplo de transtorno parafílico onde o protagonista só chega ao orgasmo através de práticas que envolvem dor, sempre de maneira compulsiva, fixa e repetitiva.


Por mais que estas práticas sexuais sejam esdruxulas, por que será que o filme e principalmente o livro Cinquenta tons de cinza fez tanto sucesso mundialmente? Isso demonstra e comprova a necessidade da busca pelo diferente no dia a dia da vida sexual das pessoas. Você pode sair da mesmice de sua vida sexual para experienciar coisas novas vibrantes e interessantes.


O acompanhamento profissional dos casos de transtornos parafílicos tem como foco a pessoa, o sujeito, que deverá ser visto através de uma abordagem acolhedora e neutra de juízo de valores para que esse indivíduo adquira novas atitudes, adequando suas práticas sexuais parafílicas dentro de um ponto de corte que não traga danos para si e os outros envolvidos.

André Fraga na serie “CALL me, love” apresenta imagem onde reflete sobre a sexualidade no espaço urbano. A vitrine em Nova York mostra a singularidade de um ângulo que proporciona um jogo entre palavras e imagens parafílicas.

Em Sexologia o limite entre o adequado é inadequado e muito tênue, sutil e imperceptível. Segundo o sexólogo argentino Gindin deveria ser abolido da Sexologia a palavra normal ou anormal e evitar a bipolaridade das práticas sexuais do ser humano.


Referências Bibliográficas

ANGELO MACHADO, Neuroanatomia Funcional, 2º ed – Atheneu, São Paulo, 1993
STOLLER, J. R Observando a Imaginação Erótica, Imago, Rio de Janeiro, 1998
FREUD, S. Uma Teoria Sexual, in Obras Completas. Editorial Biblioteca Nueva, Madrid, 1967
CLAVREUL, J. ET AL. O Desejo e a perversão. Papirus, Campinas, SP, 1990
CALLIGARIS, C. A sedução Totalitária. In Clínica do Social: ensaios. Escuta, São Paulo, 1991.
Abdo, CARMITA Sexualidade Humana e seus Transtornos , 5 ª ed – São Paulo: Leitura Médica, 2014.
 
 

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