Dor e
Prazer Sexual
“A
construção da excitação erótica é toda ela tão sutil, complexa, inspirada,
profunda, fluída, fascinante, aterradora, problemática, imersa no inconsciente
e assombrada pelo gênio quanto à criação de sonhos ou arte” – STOLLER, JR. Observando
a imaginação erótica – Imago – R.Janeiro, 1998.
No artigo anterior Perversão Sexual e Parafilias sinalizei
o conceito de dor e prazer visto sob o prisma da psicanálise, onde a perversão
sexual se expressa através de práticas fixas e exclusivas com intuito de
proporcionar prazer (orgasmo) sendo considerada um desvio em relação ao ato
sexual. Também foi a partir da psicanálise que chegou-se à aceitação de que
existe um caráter desarmônico permeando o comportamento das pessoas tanto nas
relações sociais como nas práticas sexuais, através de atos de transgressões
(pedofilia) ou graus variados de permissividade frente a diversas expressões
sexuais a exemplo do sadomasoquismo. Cada cultura e sociedade tem um sistema
próprio de valores sexuais que evolui através dos tempos, como a revolução
sexual dos anos 60 com maior liberdade principalmente das mulheres após a
descoberta da pílula anticoncepcional, o surgimento da Sexologia como ciência e
mais recentemente os movimentos libertários da comunidade LGBTS, culminaram com
o crescente fenômeno de despatologização de práticas e preferências sexuais
antes consideradas perversas. As expressões sexuais que envolvem a erotização
da dor em busca do prazer passaram então a serem vistas sob um novo olhar entre
os meios científicos mundiais.

Os estados emocionais:
tristeza – medo – prazer – raiva, os
estados motivacionais primários de sobrevivência: fome – sede – sexo, e os estados sensoriais:
temperatura – dor – tato,
interligam-se a nível cerebral através de conexões neurohormonais, em áreas
especificas do tálamo, hipotálamo, sistema límbico e área pré-frontal. Estas
regiões são ricas em monoaminas: noradrenalina, serotonina, dopamina e
betaendorfina um opióide endógeno, com receptores específicos para hormônios
especialmente hormônios sexuais, o que justificaria a relação entre dor e
prazer envolvendo algumas práticas sexuais. Segundo Freud dentro de cada um de
nós existem elementos neuróticos, parafílicos e psicopatias sexuais
“adormecidas” e que podem eclodir sob diversos aspectos e gradações ao longo da
vida.

As perversões sexuais passaram
a ser denominadas parafilias, terminologia criada por Steckel, palavra de
origem grega que significa: para – ao lado, à margem e philos – amante,
atração. As parafilias são transtornos psicossexuais em que a imaginação ou
atos são necessários para a excitação sexual e orgasmo, utilizando-se de:
- Objetos não humanos
- Sexo com sofrimento e
humilhação
- Sexo sem consentimento do
parceiro
- Sexo consensual com
permissividade do outro
- Autoerotismo

Os parafílicos expressam sua
sexualidade indo de encontro às regras sócio sexuais vigentes criando uma
linguagem privada. Seus desejos subvertem a ordem sexual imposta, desconhecendo
o outro e não consideram suas práticas como um problema. Só procuram ajuda
quando são levados pelos parceiros ou apresentam disfunções sexuais, sofrem
repressão da lei através de denúncias e prisões ou através da pratica do
autoerotismo fatal por asfixia.

As parafilias apesar de serem comportamentos sexuais atípicos não são
mais consideradas transtornos mentais; elas permeiam a sexualidade humana desde
que haja consentimento ou não envolva danos físicos, psicológicos e morais a
outros. Quando causam sofrimento e violência e são de caráter fixo, rígido,
compulsivo e repetitivo, essas expressões passam a ser patológicas são denominadas
de transtornos parafílicos. Eles
podem trazer consequências danosas para os praticantes, suas vítimas ou
parceiros:
-
Transmissão de DSTs (HIV, Hepatite, etc)
-
Incontinência Fecal (Síndrome de Tardieu)
-
Lesões corporais graves
-
Alterações anatômicas e funcionais de órgãos
-
Hemorragias
-
Outros danos
A seguir apresento as
principais classificações de transtornos da preferência sexual (TPS) e dos
transtornos parafílicos (TP), segundo o CID 10 (Código Internacional das
Doenças) e o DSM-5 (Manual Diagnostico e Estatístico de Transtornos Mentais):
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Adaptado
do livro Sexualidade Humana e seus Transtornos, Carmita Abdo 5 ª ed – 2014.
|
Para ilustração dos conceitos
de parafilias e transtornos parafílicos a exemplos de filmes recentes: Cinquenta tons de cinza, onde a parafilia estar representada
com envolvimento emocional do casal inclusive com práticas sexuais diversas; já
no filme Ninfomaniaca é um exemplo
de transtorno parafílico onde o protagonista só chega ao orgasmo através de
práticas que envolvem dor, sempre de maneira compulsiva, fixa e repetitiva.

Por mais que estas práticas
sexuais sejam esdruxulas, por que será que o filme e principalmente o livro Cinquenta tons de cinza fez tanto
sucesso mundialmente? Isso demonstra e comprova a necessidade da busca pelo
diferente no dia a dia da vida sexual das pessoas. Você pode sair da mesmice de
sua vida sexual para experienciar coisas novas vibrantes e interessantes.

O acompanhamento profissional
dos casos de transtornos parafílicos tem como foco a pessoa, o sujeito, que deverá
ser visto através de uma abordagem acolhedora e neutra de juízo de valores para
que esse indivíduo adquira novas atitudes, adequando suas práticas sexuais
parafílicas dentro de um ponto de corte que não traga danos para si e os outros
envolvidos.
Em Sexologia o limite entre o adequado
é inadequado e muito tênue, sutil e imperceptível. Segundo o sexólogo argentino
Gindin deveria ser abolido da Sexologia a palavra normal ou anormal e evitar a
bipolaridade das práticas sexuais do ser humano.
Referências Bibliográficas
ANGELO MACHADO, Neuroanatomia Funcional, 2º ed
– Atheneu, São Paulo, 1993
STOLLER, J. R Observando a Imaginação Erótica,
Imago, Rio de Janeiro, 1998
FREUD, S. Uma Teoria Sexual, in Obras
Completas. Editorial Biblioteca Nueva, Madrid, 1967
CLAVREUL, J. ET AL. O Desejo e a perversão.
Papirus, Campinas, SP, 1990
CALLIGARIS, C. A sedução Totalitária. In
Clínica do Social: ensaios. Escuta, São Paulo, 1991.
Abdo, CARMITA Sexualidade Humana e seus
Transtornos , 5 ª ed – São Paulo: Leitura Médica, 2014.
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